Meditação, Pratique

A Meditação no Oṁ da Māṇḍūkyopaniṣad

Esta Upaniṣad começa com uma afirmação: tudo o que aqui está, tudo o que aqui esteve, tudo o que aqui estará, é Oṁ. É assim que a discussão inicia. Idaṁsarvaṁ, inclui tudo o que está aqui: o que conheço e o que desconheço, o que existiu, o que existe agora, o que irá existir no futuro. Oṁ ityetadakṣaramidaṁ sarvaṁ: “a sílaba Oṁ e tudo isto que está aqui”.

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O Oṁ na Māṇḍūkyopaniṣad

A Upaniṣad começa assim:

oṁ ityetadakṣaramidaṁ sarvaṁ
tasyopavyākhyānaṁ bhūtaṁ bhavad
bhasiṣyaditi sarvamoṅkāra eva |
yachchānyat trikālātītaṁ tadapyoṅkāra eva || 1 ||

“O Oṅkāra é tudo o que está aqui. Aqui [inicia] a clara exposição:
tudo o que foi, o que é e o que será, é de fato Oṁ. Tudo o que há
além dos três períodos do tempo é também, de fato, Oṁ.” || 1 ||

Esta Upaniṣad começa com uma afirmação: tudo o que aqui está, tudo o que aqui esteve, tudo o que aqui estará, é Oṅkāra. É assim que a instrução inicia. Isto é um mantra, não um verso.

Idaṁsarvaṁ, inclui tudo o que está aqui: o que conheço e o que desconheço, o que existiu, o que existe agora, o que irá existir no futuro. Oṁ ityetadakṣaramidaṁ sarvaṁ: “a sílaba Oṁ e tudo isto que está aqui”.

Oṁ meditação Swāmi Dayānanda

Em sânscrito há raízes para todas as palavras. Essas raízes podem esclarecer coisas sobre as palavras, através do conjunto das regras da gramática, chamado vyākaraṇa. Há somente 2000 raízes, das quais derivam infinitas palavras.

Não dizemos isto em sentido figurado: a possibilidade de compor novas e novas palavras baseando-nos nessas 2000 raízes, combinadas entre si, com seus sufixos, nominais e verbais, e com seus prefixos, torna as combinações, de fato, infinitas.

As raízes também dão lugar a verbos. Uma vez que elas se tornam verbos, chamam-se pādam, palavra que aponta para o fato de que coisas serão compreendidas através deles.

O Oṅkāra é um desses pādas; ela deriva da raíz avarakṣane, e está vinculada com rakṣanam, termo que designa àquele que protege, alguém que é uma fonte de proteção, e que ao mesmo tempo sustenta tudo.

Essa causa, se podemos usar esta palavra, a causa de tudo, aquele que tudo sustenta e a quem tudo deve sua existência, é o Oṅkāra: avati rakṣati Oṁ.

O Oṁ é formado pelo ditongo a+u, somado ao makāra, a letra . Você não deve prolongar demasiadamente, tipo o Oṁ “sirene”, nem fazê-lo breve demais, tipo o latido de um cachorro. O mantra dura três tempos, três mātras, o que significa um pouco menos de três segundos. Esses três mātras são o resultado da soma do a curto, mais o u curto, mais o .

Há muitas “versões” do Oṁ, tantas quanto estados há na Índia. Nós estamos expondo aqui a maneira de pronunciar esta sílaba segundo o vyākaraṇa de Pāniṇi. O Oṁ é idaṁsarvaṁ, tudo o que aqui está.

No gāyatrī mantra, o Oṁ está no início. Não é “acrescido” ao mantra, mas faz parte dele. Bhūr, bhuva e svāḥ são vyakṛtas, são acéscimos. Quando você recita o mantra, está dizendo exatamente isto: Oṁ é tudo o que está aqui, idaṁsarvaṁ.

O Oṅkāraḥ é Brahman

Sarvaṁ oṅkāra eva: tudo o que está aqui é Oṁ. Oṁ é um mantra, que é um nome. Um nome que aponta para Brahman, que é a causa do mundo. Há uma diferença entre um nome e uma palavra. Oṁ é o mantra. Compreender Oṁ é compreender Brahman.

A argila, que é achetana, nem senciente nem consciente, manipulada por um oleiro inteligente e competente, torna-se um pote. Assim, a combinação da causa material com a causa inteligente resulta no pote. Pode haver ainda causas secundárias, como a água, o fogo ou o torno onde o pote é feito.

Oṁ: Causa material, causa instrumental

Para a criação do jagat, nimittakaraṇa, a causa inteligente, é Brahman. A causa material é Brahman. As causas secundárias também são Brahman.

No bhāṣya (comentário) da Muṇḍakopaniṣad, Ādi Śaṅkara ilustra isto com o exemplo da aranha, ūrnanābhiḥ: ela produz o fio a partir do seu próprio corpo. Se ela decidir, em qualquer momento, retornar pelo caminho feito, reabsorve o fio em seu corpo.

Este é um exemplo simples, com implicações muito interessantes. A aranha é um ser inteligente, que tem o conhecimento e a habilidade, bem como as outras condições secundárias necessárias, os upakaraṇas, para fazer o fio, como por exemplo a presença da glândula que lhe permite tecer.

Ela produz o fio e, se precisar, o absorve de volta. Brahman, similarmente, cria o universo, o sustenta, e o reabsorve no fim de cada ciclo cósmico.

O significado implícito nisto é grande. A aranha é o fazedor, e é ao mesmo tempo a causa material do fio. Brahman é ao mesmo tempo a causa material e a causa instrumental da criação. Sendo Brahman tanto a causa instrumental quanto a causa material, o efeito, a criação, não está separado dessas causas.

O termo vyākhyānaṁ designa uma clara e completa exposição sobre algum assunto. O que abrange, exatamente, o Oṁ? Tudo o que existiu no passado, o que existe agora neste momento, e o que virá a existir no futuro, diz o mantra.

E ainda, conclui dizendo que “tudo o que há além dos três períodos do tempo é também, de fato, o Oṁ.” Trikāla são os três períodos de tempo: presente, passado e futuro. Trikālātītaṁ é o que transcende esses três períodos.

As pessoas buscam um professor, se mudam para a casa dele, passam um bom período de suas vidas aprendendo com ele, com o propósito de obter conhecimento.

Yama explica para Nachiketas na Kaṭha Upaniṣad o que os quatro Vedas ensinam, que é exatamente aquilo que é buscado no gurukulam, na casa do professor. Ele diz:

“Explicar-te-ei, resumidamente, a meta declarada pelos Vedas, o objetivo de todas as austeridades, que os homens realizam ao levar uma vida de continência. Essa meta é a sílaba sagrada [Oṁ]. Essa sílaba sagrada é, em verdade, o puro Brahman. Esta sílaba é a meta mais elevada.

“Quem a conhece, realiza todos seus objetivos. Ela é o melhor apoio, o mais elevado sustento. Quem conhece este esteio reside feliz no mundo de Brahman” (I:2,15-17).


Tradução de Pedro Kupfer, sobre uma palestra de Swāmi Dayānanda ministrada no Dayānanda Āśram, Rishikesh, Índia, em abril de 2012.

Temos um curso online sobre a Māṇḍūkyopaniṣad aqui. O convite segue neste vídeo:

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Swāmi Dayānanda Saraswatī (1930-2015) ensinou a sabedoria tradicional do Vedanta por cinco décadas, na Índia e em todo o mundo. Seu sucesso como professor é evidente no sucesso dos seus alunos: mais de 100 deles são agora Swāmis, altamente respeitados como estudiosos e professores.

Dentro da comunidade hindu, ele trabalhou para criar harmonia, fundando o Hindu Dharma Acharya Sabha, onde chefes de diferentes seitas podem se reunir para aprender uns com os outros.

Na comunidade religiosa maior, ele também fez grandes progressos em direção à cooperação, convocando o primeiro Congresso Mundial para a Preservação da Diversidade Religiosa.

No entanto, o trabalho de Swāmi Dayānanda não se limitou à comunidade religiosa. Ele é o fundador e um membro executivo ativo do All India Movement (AIM) for Seva.

Desde 2000, a AIM vem trazendo assistência médica, educação, alimentação e infraestrutura para as pessoas que vivem nas áreas mais remotas da Índia.

Havendo crescido em uma pequena vila rural, ele próprio entendeu os desafios particulares de acessar a ajuda enfrentada por pessoas de fora das cidades. Hoje, o AIM for Seva estima ter ajudado mais de dois milhões de pessoas necessitadas em todo o território indiano.

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Uma resposta para “A Meditação no Oṁ da Māṇḍūkyopaniṣad”

  1. O mais lindo no Yoga é a profundidade que aos poucos, ao “acaso”, vamos trazendo nossas percepções, o que nos faz tomar uma postura de eternos aprendizes. Gratidão pela partilha Pedro!

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